domingo, 12 de junho de 2011

Rua das Gáveas

A maioria das gentes não merece sequer uma das muitas linhas que lhes são dedicadas nos jornais, diz a mamã. Mas há pessoas, para as quais nem todas as linhas do Mundo chegariam para descrever a grandeza do seu coração. Este texto sai hoje, lá no jornal da mamã. Pequenino, num canto de página, que a maioria das gentes vai voltar sem sequer ler uma linha, quanto mais nas entrelinhas... No entanto, as grandes lições de vida podem ser assim: pequeninas, mas cheias de tudo aquilo que verdadeiramente é importante.

"É numa varanda de sacada, em plena Rua das Gáveas, que Carlos Mascarenhas ainda "parece que vê" a sua Teresa descer aquela rua empedrada e estreita do Bairro Alto.
O bairro onde ambos nasceram e o amor floriu como as sardinheiras, entre marinheiros, pregões e vendedores de jornais, mesmo contra a vontade do irmão dela. Foi dali que saíram para casar, castiços de traje de gala, pingando orgulho de serem os primeiros noivos de Santo António. A madrinha foi a fadista Hermínia Sílvia, que mal lhes conhecia o fado mas mesmo assim emocionou-se na velhinha Igreja de Santo António.
Na casa das Gáveas, nasceu o único filho do amor eterno de Carlos e Teresa e é agora ali que jazem nas prateleiras as fotografias das netas, das quais nada sabe "há anos".
Resta agora só, cada vez mais só, na sua casa com varanda de sacada, Carlos. E a ele, restam-lhe tão somente as recordações. "Ela era a minha vida, a minha alegria. É uma saudade que nunca mais acaba e todos os dias me faz chorar", diz ele, que continua a deslocar-se aos encontros de noivos de Santo António que a Câmara periodicamente organiza, lamentando apenas ter de sentar-se na ala dos viúvos.
"A minha Teresa sempre foi fraca. Nem 40 quilos tinha quando casámos, sofria dos pulmões e chegou a estar no sanatório Rainha D. Amélia. Por causa disso arranjei uma casa ali para os lados da Malveira, que os ares faziam-lhe bem. Ah... e como ela gostava de passear". Os ares da serra deram-lhe força, mas o cancro levou-a em 2006. Só não levou o amor, que ainda consome Carlos numa eterna sudade".

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